Estado tem 409 imóveis públicos sem utilização, aponta cadastro

Sujeira, lixo, vidros quebrados e abandono completo. Na Rua da Azinheira, Pitimbu, zona Sul de Natal, um imóvel amarelo arrodeado de árvores e uma extensa área verde chama atenção de quem passa por perto. Naquele lugar, por vários anos, funcionou a 11ª Delegacia de Polícia de Natal, desativada desde 2016. O local está em estado de abandono e não há perspectivas, pelo menos a curto prazo, para sua utilização. O que deveria ser uma DP faz parte do inventário de imóveis do RN e se soma a outros 409 em “desuso”, segundo informações públicas do Portal de Imóveis do RN.

A reportagem da Tribuna do Norte mapeou alguns desses lugares e fez visitas durante as duas últimas semanas. Na antiga 11ª DP, há infiltrações, mato alto, lixo, roupas, e folhas das árvores ocupando o chão que antes era para recepcionar vítimas e a população. Os vidros das janelas estão quebrados em parte. Há infiltrações no teto, com telhas quebradas e parte da estrutura deteriorada. Fios e partes das janelas foram furtados ou depreciados. Segundo informações de populares, é comum a entrada de pessoas no local para fazer necessidades básicas e uso de drogas. Não há nenhum aviso ou grade para impedir entrada de populares.

“Tem de tudo ali dentro. Já roubaram as portas, uns armários que tinham, tiraram parte do telhado. Ali dormia gente também. Hoje não, parece que isso acabou-se, mas os caras usavam drogas ali dentro. Esse terreno propicia assalto, furto, à noite é perigoso demais para passar naquele setor. De noite você não vê um pé de gente aqui não”, reclama o dono de uma mecânica próximo à antiga DP, José de Brito, 63 anos.

No Portal de Imóveis do Governo do RN (Sipat), consta que a área do terreno é de 525 m², com 149 m² de área construída. O valor de mercado do imóvel em 2020, segundo laudo de avaliação feito por engenheiros civis contratados pelo Governo, é de R$ 312 mil.

Em nota, o Governo do Estado diz que no Sipat já constam 2.217 imóveis que foram georreferenciados e avaliados de um total de 3.451 cadastrados no inventário. Desses, mais de mil unidades estão em processo de regularização fundiária. Somente neste ano, o Conselho de Gerenciamento de Patrimônio (CGP) já deliberou a respeito de 291 propriedades, sendo 184 unidades de educação, 61 da saúde, 28 da polícia, 13 terminais rodoviários e cinco terrenos e sítios. O Governo não informou quanto é pago, atualmente, em aluguéis.

“A importância desse processo de regularização de imóveis permitiu, por exemplo, a cessão de terrenos para a implantação de unidades básicas de saúde e creches, na capital, algo inviável antes considerando que as documentações desses imóveis não estavam regularizadas”, afirma a nota.

Ainda segundo o Governo, outra ação de gestão patrimonial em andamento é o levantamento sobre as necessidades imobiliárias de cada secretaria e órgãos do Governo “bem como, a discussão de propostas para destinação dos imóveis em desuso que são, em sua maioria, terrenos ou construções em situação de ruína”.

“Exemplos desse trabalho são 16 unidades das Centrais do Cidadão que mudaram para prédios próprios do Executivo Estadual. Em 11 o governo deixou de pagar aluguel, gerando uma economia de mais de R$ 100 mil por mês”. O Governo também destacou que algumas secretarias e autarquias foram acomodados em outras secretarias e órgãos.

Segundo a auditoria do Tribunal de Contas do Estado , o RN gastava R$ 6,4 milhões com alugueis por ano entre 2015 e 2017.

Imóveis
Outro imóvel em completo estado de abandono é um localizado na avenida Coronel Estevam, avaliado em R$ 1,3 milhão. Na documentação consta que o imóvel era ocupado pelo antigo Banco do Rio Grande do Norte (Bandern), que sofreu liquidação extrajudicial em 1990.

Na visita da TN ao local, o imóvel está minimamente murado para impedir o acesso de populares, mas com um leve esforço é possível adentrar o imóvel, que tem 868,32m² e 192m² de área construída. A casa já está deteriorada, com paredes e azulejos despedaçados, infiltrações, mato alto e lixo no local. “Uma vez jogaram restos de um cavalo morto aqui”, disse uma mulher que não quis se identificar.

O terreno, situado numa das maiores alas comerciais de Natal e praticamente no coração do Alecrim, está em desuso e abandono e incomoda comerciantes e moradores locais. A iniciativa de murar o espaço foi do empresário Marcel Lima Medeiros, 40 anos, cansado dos furtos e roubos em sua clínica, instalada ao lado do terreno.

“Pra nós é um transtorno enorme. Desde que a clínica abriu, em 2014, aquele terreno está abandonado e só piora. Já fizemos várias denúncias, mas o Poder Público nunca tomou nenhuma providência. Principais problemas são a segurança, várias pessoas suspeitas entram lá, usam drogas, necessidades básicas. Tivemos que, do nosso bolso, mandar fazer tijolos para fechar o portão de entrada de carros. A clínica já foi arrombada três vezes, levaram notebooks, TVs, celulares, fora o prejuízo na cerca elétrica, grade”, reclama.

A TN visitou outros dois terrenos que o Portal de Imóveis do RN classifica como “em desuso”. Um deles foi o terreno localizado na avenida Nevaldo Rocha, no bairro Dix-Sept Rosado, onde funcionava o extinto Hospital Sandra Celeste. No terreno, está sendo feito uma Unidade Básica de Saúde do bairro, com recursos da ordem de R$ 1,2 milhão. Segundo o secretário de saúde de Natal, George Antunes, o terreno foi cedido à Prefeitura “ad eternun” e que a expectativa é concluir as obras no fim do ano. O espaço tem 990 m² e é avaliado em R$ 1 milhão.

Outro terreno abandonado fica na avenida Prudente de Morais, ao lado da Escola Estadual Augusto Severo. O espaço está todo murado e com uma pintura que diz “Este imóvel pertence ao patrimônio do RN”. Na época da consultoria feita pelo Estado, o terreno, com 89m² estava abandonado e sem muros, sujeito a invasões.

“Esse prédio aberto corria risco de assaltos, de doenças porque o pessoal jogava lixo ali. Era tudo sujo. Hoje fechado, não sei como está lá dentro, mas pode ter foco de dentro também. Não conseguimos entrar, não tem acesso nenhum. Teve um episódio uma vez que uma moça foi assaltada e correu aqui para escola. O cara estava dentro do terreno”, lembra a professora Lizimar de Souza, 48 anos. O terreno vale R$ 687 mil. Atualmente não tem destinação.

Governo discute uso de imóveis públicos
O Governo do Estado apontou, em nota, que discute a utilização dos imóveis em desuso que fazem parte do seu patrimônio. Um decreto acerca da destinação deve ser publicado em breve, de acordo com a nota. O Governo destaca a criação do o Sistema de Patrimônio Imobiliário do Rio Grande do Norte, que faz o “rastreio e mapeamento que assegura o controle de inventário para a localização dos ativos imobiliários pertencentes ao Executivo Estadual”.

“Outra ação de gestão patrimonial em andamento é o levantamento sobre as necessidades imobiliárias de cada secretaria e órgãos do Governo bem como, a discussão de propostas para destinação dos imóveis em desuso que são, em sua maioria, terrenos ou construções em situação de ruína. Exemplos desse trabalho são 16 unidades das Centrais do Cidadão que mudaram para prédios próprios do Executivo Estadual. Em 11, o governo deixou de pagar aluguel, gerando uma economia de mais de R $100 mil por mês. Através do diálogo também está sendo possível otimizar os espaços nas secretarias e órgãos. A Secretaria de Estado das Mulheres, da Juventude, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos (SEMJIDH) e o Procon foram acomodados na Secretaria de Agricultura, da Pecuária e da Pesca (SAPE); a Secretaria do Desenvolvimento Rural e da Agricultura Familiar (SEDRAF) foi para o prédio da EMATER e a Secretaria do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (SEMARH) está de mudança para o DER”, diz a nota.

Um grupo de trabalho, com técnicos e gestores da PGE, Sead, Control e Seplan, atua na normatização dos imóveis sem uso “para que a partir daí se tenha todos os dados necessários desses imóveis para tomadas de decisões quanto à destinação deles”, diz a nota. A minuta do projeto já está em fase adiantada e, segundo o Governo, vai trazer avanços no que diz respeito à gestão patrimonial do Estado. “A Política de Patrimônio do Governo do Estado é inédita e contínua. Em quase quatro anos, houve muito avanço”, assegura.

Em relação aos gastos com aluguéis, que teoricamente poderiam ser economizados se prédios que já são do patrimônio público fossem aproveitados, o Estado tem realizado um levantamento, que ainda não está pronto. Segundo a auditoria mais recente do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RN), o RN gastava R$ 6,4 milhões com alugueis por ano.

“Quanto às despesas globais com aluguel de imóveis, esse levantamento ainda está sendo feito. Trata-se de ato contínuo ao trabalho feito de identificação de imóveis, e suas condições do ponto de vista estrutural e de documentação. Cada secretaria/órgão coordena seus próprios contratos, de maneira que esses dados não convergem para uma plataforma (sistema) única, por enquanto, o que demandaria verificar caso a caso. Um trabalho em andamento”, diz a nota do Governo.

As modificações implementadas pelo Governo do Estado acontecem após apontamentos do TCE, que “divulgou uma auditoria apontando falhas no controle da gestão patrimonial cuja base de dados utilizada fazia referência ao período de 2015 a 2017, no governo que antecedeu à atual gestão do Estado, e que levou à lamentável situação apontada pelo TCE”, acrescenta a nota.

“É importante destacar que, desde 2019, vários órgãos atuam para oferecer ao Governo do Estado não apenas conhecer detalhadamente esse patrimônio, mas regularizar e oferecer ao gestor o diagnóstico necessário às tomadas de decisões sobre as medidas mais eficazes e eficientes”, finaliza.

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