Explosão de gastos da Previdência tira dinheiro de escolas, hospitais e obras

Há mais de dez anos que os gastos do Ministério da Previdência Social crescem acima da média do total de recursos do Orçamento da União. Entre 2001 e 2014, o volume autorizado para aposentadorias, pensões e benefícios aumentou 120%. Eram R$ 182,6 bilhões há 13 anos, em valores de 2013, e chegaram a R$ 402,1 bilhões em 2014.

No mesmo período, o gasto total do governo cresceu 93%, de R$ 918,4 bilhões para quase 1,8 trilhão. Com isso, a Previdência toma cada vez mais espaço no Orçamento. Representa hoje 22,7% de tudo o que o governo gasta. Em 2001, essa parcela era de 19,9%.

Os dados fazem parte das séries históricas que compõem o Mosaico do Orçamento, uma plataforma interativa aberta na internet desenvolvida pela Diretoria de Análise de Políticas Púbicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV/DAPP) que permite visualizar o destino dos gastos públicos.

Atualmente, de cada R$ 5 gastos pelo governo, R$ 1,13 vai para aposentados e pensionistas. Quase 97% dos R$ 402,1 bilhões autorizados este ano para o Ministério da Previdência são verbas carimbadas para o pagamento de benefícios, que independem da decisão do ministro.

Isso ajuda a explicar porque o PMDB tenta trocar a pasta por outra, com mais recursos livres, no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. O atual ministro, Garibaldi Alves (PMDB-RN) já descreveu a Previdência como um “abacaxi”.

Outra pasta com gastos obrigatórios crescentes, a Educação ultrapassou o Ministério da Defesa e assumiu a terceira posição entre os maiores orçamentos da Esplanada. Entre 2011 e 2014, a dotação do MEC subiu 186%, de R$ 34,8 bilhões para R$ 99,7 bilhões. A fatia no Orçamento subiu de 3,8% para 5,6%. Já o Ministério da Saúde, o segundo maior orçamento do governo, conseguiu elevar seus gastos em 88%, de R$ 56,8 bilhões para R$ 107,2 bilhões, mas ficou estacionado em 6% do total dos gastos públicos.

Ministérios com menos gastos obrigatórios acabam desfavorecidos na disputa por recursos. Apesar da ofensiva internacional iniciada pela diplomacia do governo Lula, as pastas da Defesa e de Relações Exteriores viram suas fatias caírem desde 2001. A participação da primeira caiu 5,6% de para 4,2%. O Itamaraty, que tinha apenas 0,23% em 2001, agora tem menos ainda: 0,13% do Orçamento. O número ajuda a explicar as queixas recentes de servidores sobre atrasos no pagamento de aluguéis no exterior.

Juntas, as verbas de Saúde, Educação, Defesa e Relações Exteriores somam 70% do que gasta a Previdência sozinha. Como O GLOBO revelou ontem, esse protagonismo da Previdência só é ofuscado pelos encargos financeiros da União, como juros e amortizações da dívida, que consomem 23% do Orçamento deste ano (cerca de R$ 410 bilhões).

Enquanto a presidente Dilma Rousseff anuncia mudanças na política econômica que podem resultar na queda dos juros e do endividamento no longo prazo, o ritmo do crescimento dos gastos com a Previdência e a demografia indicam que a conta dos benefícios vai pesar cada vez mais.

Especialista em finanças públicas, o economista Fabio Giambiagi diz que a situação é preocupante porque o contingente de idosos na população aumenta de forma acelerada — quase 4% ao ano, o dobro do crescimento médio da economia nos últimos anos. Ou seja: gastos com benefícios tendem a crescer mais do que a arrecadação de impostos.

Segundo Giambiagi, em 1988, quando a Constituição foi promulgada ampliando o acesso à Previdência, a despesa do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) era o equivalente a 2,5% do Produto Interno Bruto. Seu sucessor, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), gasta hoje perto de 7,5% do PIB.

Para Giambiagi, que estuda a Previdência há duas décadas, a explosão dos gastos pode ser explicada por três fatores. O primeiro é a política de valorização do salário mínimo, referência da correção dos benefícios. Outro problema: a aposentadoria precoce, que leva o país a usar parte dos impostos com pessoas ainda em idade produtiva — e deixar de investir em Infraestrutura, por exemplo. Em terceiro lugar, ele cita os critérios de extensão dos benefícios para dependentes:

— Temos o regime de pensões mais generoso do mundo. Quem não se aposenta por idade se aposenta muito cedo. Uma mulher de 20 anos que se casa com um senhor de 80 e fica viúva no mês seguinte vai herdar uma pensão integral por 60 a 65 anos. É um caso extremo, mas o fato de a legislação permitir um disparate desses é a prova cabal da incúria com que os recursos públicos são tratados no Brasil.

O GLOBO

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