Governadora Fátima Bezerra afirma ‘chance zero’ de ser a vice de Lula em 2022

A Marie Claire, edição que chega às bancas neste fim de semana, traz a governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT), como nunca antes ela se expôs.

Sem “armários” e sem cortes, ela responde perguntas, pela primeira vez, de sua vida íntima, embora sem se alongar (veja na página 4), reafirmando a sua condição de aliada da comunidade LGBTQIAP+.

No plano político, a governadora descarta qualquer possibilidade de ser vice do ex-presidente Lula (PT), mas defende a presença de uma mulher na chapa presidencial, sugerindo o nome da empresária Luiza Trajano.

Veja trechos importantes da entrevista quando o assunto é política:

Marie Claire – Como é a sua relação com o ex-presidente Lula?

Fátima Bezerra – Acima de tudo, marcada por muito afeto. Somos amigos. Não tenho dúvida do imenso carinho que o presidente Lula tem por mim. E ele sabe que a recíproca é verdadeira. Para você ter uma ideia, a minha eleição em 2002 para deputada federal, no mesmo período em que ele se elegeu presidente da República, quebrou um paradigma. Porque até então o Rio Grande do Norte nunca tinha eleito uma pessoa para a Câmara com um perfil como o meu. Até então as vagas eram ocupadas predominantemente pelos filhos, herdeiros diretos das oligarquias aqui do estado. Eu quebrei essa tradição. E fui a mais votada.

MC – Sobre o pleito presidencial de 2022, imagino que a senhora veja o presidente Lula como um candidato. Me pergunto sobre essa chapa presidencial e sobre a importância de ter um nome de mulher para compô-la. Tem chances de esse nome ser o da senhora?

Chance zero.

MC – Não faz parte dos seus planos?

Não. Minha missão continua no Rio Grande do Norte. Mas quero dizer que compartilho inteiramente da sua reflexão, e que possamos ter a presença de mulheres na chapa presidencial.

MC – Quem seria a mulher para compor chapa com Lula?

Claro que isso não está em discussão, ela própria já disse que não, mas eu torcia pelo Lula presidente tendo como vice Luiza Trajano. É uma mulher de protagonismo, tem responsabilidade social, sensibilidade com a defesa da justiça social. É respeitada nacionalmente.

MC – Estava olhando as pesquisas eleitorais que já começaram. Não há nomes de mulheres. Os institutos de pesquisa nem sequer as colocam no jogo. Tem reflexo aí do machismo dos partidos, que alcança os institutos?

Só tem, infelizmente. Quando olhamos no Parlamento federal, num total de 513 cadeiras, nós não conseguimos passar de 15%, temos 77 deputadas federais. No Senado tem 81 parlamentares, temos 12 senadoras. Quando fazemos um panorama em nível mundial de participação das mulheres na política, o Brasil está na 132ª posição em um ranking de 193 países. Ficamos atrás de países como Cuba, Bolívia, México, Costa Rica. É o reflexo do patriarcado, de que as mulheres foram criadas para ficar em casa. Quem cuida da casa? Dos filhos? E dos idosos? Nossa sociedade foi se moldando à luz desse modelo, que se reflete nos vários campos, inclusive na política. A maioria dos partidos tem perfil machista.

MC – Pensando no governo Bolsonaro e no fato de a senhora ser governadora durante esse período: como vê a forma como a educação está sendo tratada?

É uma tragédia. Uma das áreas mais afetadas nesses tempos de governo autoritário que nós estamos vivendo é a educação. Há mais de um ano que nossos estudantes estão sem atividades presenciais. Tudo em decorrência dessa pandemia devastadora que se agravou mais ainda pelo negacionismo adotado pela maior autoridade do país, que não apostou na vacina. Sem contar o incentivo à aglomeração, receitar remédio que não tinha comprovação científica. Você não sabe o quanto me aperta o coração de professora ver nossos estudantes, em uma parcela considerável, que passaram aí mais de um ano sem ter acesso a conteúdo nenhum, porque a pandemia escancarou as desigualdades regionais existentes em nosso país. Tem muitos garotos e garotas que não têm essa plataforma digital que temos aqui.

MC – E quanto ao Ministério da Educação, governadora?

Simplesmente largou a educação à própria sorte. Quando abrem a boca é para dizer o que não deveriam. Como a recente declaração do ministro [que disse] que não precisa expandir as vagas na universidade. Que heresia é essa? A taxa de inserção dos nossos jovens no ensino superior é muito baixa. Nós podemos [olhar] aqui nos países vizinhos da América Latina, não vou nem falar da Europa. Quando você pega a população escolarizada, de 17 até 25 anos, nossa taxa está em torno de 21%. Os países vizinhos estão acima de 30%, 40%. Primeiro que você não pode trabalhar com isso de “agora vou fortalecer só uma modalidade da educação”. A gente precisa investir na educação como um todo. A educação foi uma área duramente afetada, programas que vinham dos governos anteriores foram descontinuados.

MC – Por exemplo?

Programas importantes nessa área de formação inicial e continuada. Todas as instâncias de debate com a sociedade, como o Fórum Nacional da Educação, que foi extinto. O autoritarismo dentro das nossas universidades, dos institutos federais, passando por cima da própria Constituição, não respeitando a escolha da comunidade e nomeando interventores. Sem falar no ponto de vista orçamentário. Os institutos federais, assim como as universidades, pedindo socorro – e eles estão pedindo socorro não para investimento, essa é uma palavra proibida. Pedindo socorro para custeio, para pagar água, luz, para manter o mínimo de bolsas. Um governo que elege Paulo Freire como inimigo não precisa dizer mais nada. É a cara do obscurantismo. Participei dos governos de Lula e Dilma. Preciso registrar o papel do ministro Fernando Haddad, um dos melhores que esse país já teve. Eu estava lá, participei intensamente do Prouni, do Refis, que permitiu que as mulheres quilombolas, indígenas, marisqueiras e negras entrassem nas universidades.

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