“Quando a Reitora sai pela porta dos fundos”, Por Modesto Neto*

“A barricada fecha a rua, mas abre a via” – (Paris, 1968).

A história das universidades é também a história do movimento estudantil e suas lutas. Alguns destes enfrentamentos que são travados nas instituições de ensino marcam a memória da comunidade acadêmica e registram a rebeldia que sacode as estruturas, contesta as autoridades e rejeitam a falsa democracia que é vendida pelos conselhos superiores da universidade, que funcionam quase que exclusivamente como chancela das decisões definidas pela Reitoria. A representação estudantil nestes conselhos é historicamente minoritária, hoje não é diferente. Iludir-se com o verniz democrático destes conselhos além de um equivoco político, é tolice.

Com o aprofundamento da crise do capitalismo no Brasil, os desafios postos ao conjunto dos movimentos sociais só cresce. O inábil Governo Dilma cruzou os joelhos para o mercado e em sinal de total rendição entregou as rédeas da política econômica ao feroz financerista, Joaquim Levy, fiel representante da burguesia. O tal “nacional-desenvolvimentismo” deu lugar ao neoliberalismo puro e o resultado é um Ajuste Fiscal acima de R$ 70 bilhões, cobrado no andar de baixo da sociedade. Mais de 40 universidades tiveram suas atividades paralisadas por greves que se multiplicam. Os trabalhadores da educação que querem melhores salários e os estudantes que necessitam de assistência estudantil vivem grave ameaça, e, neste sentido a resposta só pode ser uma: mobilização.

Na UFRN, embora o sindicato dos professores não tenha deflagrado greve, as lutas continuam sendo encampadas. Recentemente o Conselho Superior de Administração (o CONSAD) ratificou a política de austeridade do Governo Federal e da Reitoria, cortando R$ 3,5 milhões da assistência estudantil. Isso significa dizer que a permanência estudantil na universidade que já era horrível, ficará pior. Mas, nem tudo são trevas e escuridão. O ataque frontal a estudantada unificou as diversas organizações do movimento estudantil que mobilizaram um ato e se fizeram presentes na reunião ordinária do CONSAD na tarde deste 17 de setembro. A mobilização provou vitalidade e a reitora Ângela Paiva, forçada a suspender a reunião, retirou-se pela porta dos fundos da Sala dos Colegiados.

O sociólogo Álvaro Bianchi (1) corretamente afirma que somente as mobilizações estudantis na interpelação as autoridades universitárias colocam em evidencia pautas que de outro modo permaneceriam na penumbra. O episódio aqui citado da recente mobilização na UFRN não se reverteu numa vitória concreta com a reversão dos cortes orçamentários, mas bagunçou os planos da Reitoria, atestou disposição de luta dos estudantes, clarificou o tamanho do problema e lançou as bases para que o próximo capítulo desta novela possa ser mais animador. Se uma vitória se tornará plausível, isto dependerá dos próximos movimentos.

O contingenciamento da verba de assistência estudantil ocorreu em uma reunião sem a presença de representantes dos estudantes. O ideal de que a universidade pública deve ser co-gerida pelos segmentos da comunidade acadêmica (estudantes, técnicos e professores) não foi respeitado, e, uma aparte judicial, solicitando anulação desta ilegítima reunião, deve vir a calhar. Porém apenas com maiores mobilizações unificadas de lutadores do movimento estudantil, criaremos um espectro político capaz de enfrentar de frente todos os ataques: sejam os corte ou a criminalização dos movimentos como já denunciamos (2).

A história nos exige que construamos rapidamente uma grande plenária sob a insígnia da luta contra os cortes com todos os segmentos que fazem a universidade. Quando a ordem se vê encurralada e a Reitora sai pela porta dos fundos, talvez acene no horizonte uma maior ascensão das lutas sociais. As mobilizações precisam parar a universidade porque só elas, barraram os ataques à educação e abrem uma nova via para mudanças. O tamanho do desafio é enorme, mas unificado, o movimento estudantil também é.

(*) – Historiador, cientista social e militante do PSOL.

NOTAS

(1) – Transgressões: as ocupações estudantis e a crise das universidades. Organizado por Álvaro Bianchi. São Paulo: Editora Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2008.

(2) – Carta aberta a Reitoria da UFRN: contra a criminalização das lutas. Por João Vitor Curió e Modesto Neto. Disponível em: http://www.modestoneto.com.br/2015/06/carta-aberta-reitoria-da-ufrn-contra.html.

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