Reforma trabalhista “rasgou” mesmo a CLT ou isso é choro de sindicalista?

A reforma trabalhista divide paixões tal qual um clássico de futebol, em que sobra gritaria e falta argumentação. A sessão no plenário da Câmara dos Deputados, que aprovou o texto-substitutivo do relator Rogério Marinho (PSDB-RN), mostrou bem o Fla-Flu que contaminou o debate: enquanto a oposição e críticos bradavam que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estava sendo rasgada e enterrada, governistas e outros comemoravam a atualização e modernização da lei. Tudo isso sem meio termo. Mas, um ponto é fato: a reforma em curso é muito mais profunda do que a proposta inicialmente pelo governo federal – e altera substancialmente as relações trabalhistas no Brasil.

Desde que foi criada, em 1943, no governo Getúlio Vargas, a CLT passou por mudanças esparsas. O fato de ter passado tantas décadas ‘intocada’ acabou causando um anacronismo da legislação em vigor com a realidade do país. “Se não fosse a modernização dessa lei, conviveríamos com uma CLT que diz que a mulher para litigar na justiça do trabalho precisa da autorização do marido”, exemplifica o juiz do trabalho Marlos Melek, que atuou na comissão de redação da reforma na Câmara. Ele explica que a reforma tenta colocar a CLT no espírito do seu tempo, usando como pilares a liberdade, segurança jurídica e a simplificação.

Outro exemplo da necessidade de se mexer na lei é lembrado por Elton Duarte Batalha, professor de Direito Trabalhista da Universidade Presbiteriana Mackenzie: a CLT não permite que uma pessoa com mais de 50 anos fracione as férias, porque já a considera idosa. “Essa reforma não é perfeita, mas é muito boa porque terá mais segurança jurídica, quando você analisa todos os tópicos”, analisa.

Para Batalha, a reforma não precariza os direitos dos trabalhadores, mas modifica a lógica da relação trabalhista. Atualmente, o Estado impõe os direitos e as partes sociais – empregados e empregadores – têm de cumprir. Com a reforma, são as próprias partes que poderão definir quais os pontos mais importantes da relação de trabalho, observado o mínimo da lei. “A dignidade do trabalhador está na Constituição e não vai ser tocada. Na prática, eu não vejo esse prejuízo que tanto falam”, afirma.

Debate polarizado e atropelo em Brasília

A polarização expressiva sobre o tema e o cenário político acabam por desviar o foco do debate sobre o que está de fato sendo mudado. Para o advogado especialista em relações do trabalho Fabiano Zavanella, sócio do Rocha, Calderon e Advogados Associados, algumas mudanças na CLT já deveriam ter ocorrido há tempos. “Há muitas coisas obsoletas na CLT e algumas posturas do judiciário trabalhista contribuíram para o agravamento do cenário [da crise] e até o fechamento de empregos”, pondera. Para ele, garantir o emprego também implica em preservar as empresas.

Por outro lado, ele pondera que o modo como a reforma foi conduzida em Brasília – com muita pressa – acabou por contaminar as informações sobre o conteúdo da reforma. “Se olhou para o aspecto político e se deixou de lado a análise aprofundada do que está sendo feito. Podemos questionar o processo legislativo, que foi feito no atropelo, mas com o texto tem de ter parcimônia”, analisa.

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